Alto executivo do Comitê Rio-2016 e braço direito de Nuzman tem ONG que recebeu verba de patrocinador dos Jogos

Leonardo Gryner é o braço direito de Carlos Arthur Nuzman há mais de duas décadas. Diretor geral de operações do Rio-2016, além de diretor de comunicação e marketing do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). E sócio da mulher Adriana na Organização Não Governamental “Tem Quem Queira-TQQ”, com atividade, entre outras, de produção e promoção de eventos esportivos. A ONG do alto executivo do comitê foi beneficiada com verba de um dos patrocinadores dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro e com a doação de matéria-prima de equipamentos do Boulevard Olímpico.

Em 2010, um ano após a escolha do Rio como sede dos jogos, a ONG do diretor do Comitê Rio-2016 ganhou patrocínio de R$ 512.796,39 (quinhentos e doze mil, setecentos e noventa e seis reais e trinta e nove centavos) da Embratel para projeto de “reciclagem de lonas”, a serem transformadas em bolsas e com emprego de mão de obra de ex-detentos do sistema prisional do estado do Rio, segundo ementa da estatal. Com benefício fiscal da Secretaria de Cultura do Estado do então governo de Sérgio Cabral, publicado no Diário Oficial de 8 de dezembro de 2010.

A relação da Embratel com o patrocínio dos jogos já vinha de dois anos antes de patrocinar a TQQ de Gryner. Desde 2008, quando a estatal tornou-se a primeira patrocinadora do então Comitê de Candidatura, do qual Leonardo Gryner também era parte como diretor de comunicação e marketing. Em 2011, a Embratel forma um consórcio com a Claro e em março é anunciada como patrocinadora oficial dos jogos, exclusiva na categoria Serviços de Telecomunicações. A Embratel ficou com a parte de telecomunicações fixa e a Claro com a móvel.

A Embratel não foi o único fornecedor envolvido na realização de eventos ligados aos Jogos Olímpicos a botar dinheiro na ONG de Leonardo Gryner. Ao fim do evento, a TQQ recebeu como doação a matéria-prima utilizada nas instalações do Boulevard Olímpico. Foram 3.000 metros quadrados de lonas usadas em palcos, totens, containers de informações, itens de mobiliário urbano e da sinalização.

A TQQ transformou o material recebido em mil bolsas. Na confecção das bolsas, foi empregada mão de obra de detentos, segundo entrevistas de Adriana Gryner publicadas na imprensa. De acordo com reportagem de 10 de dezembro de 2016, publicada no Correio Braziliense, as bolsas produzidas pela TQQ foram compradas pela Gael Comunicação.

A Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo checou e constatou que a Gael Comunicação, do empresário Gaetano Lops, recebeu R$ 9.107.642,38 (nove milhões, cento e sete mil, seiscentos e quarenta e dois reais e trinta e oito centavos), por meio da prefeitura do Rio, através de patrocínio do Riocentro S.A. para o “Projeto Boulevard Olímpico”, que promoveu atividades durante os jogos no Porto Maravilha, no Parque de Madureira e no Miécimo da Silva. A Gael ficou com as partes do Porto Maravilha e Parque de Madureira.

O projeto da Gael no Boulevard Olímpico ganhou seu mais forte atrativo e muita visibilidade beneficiado por uma decisão do Comitê Rio-2016: em atitude inédita em Olimpíadas, a pira olímpica foi retirada do estádio da abertura dos jogos e levada para o Boulervard Olímpico durante os dias de competição. Muito próximo a pira olímpica, a Gael botou como grande atração um balão que subia a 150 metros de altura e trazia a marca de uma cervejaria. (Na foto abaixo, Gaetano Lops e Adriana Gryner em jantar para Eduardo Paes oferecido por José Victor Oliva em 26/1/2011. Fotos divulgação)

Mas não foram só os mais de R$ 9 milhões recebidos através da prefeitura que a Gael levou pelo “Projeto Boulevard Olímpico”. Um mês depois de terminados os jogos, realizados entre 5 e 21 de agosto, a Gael levou mais R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais) da Caixa Econômica Federal (CEF) por “Patrocínio Boulevard Olímpico”, sem licitação, como está publicado no Diário Oficial da União (DOU) de 14 de setembro de 2016.

A empresa de Gaetano Lops teve ainda, antes disso, em 5 de maio de 2016, o “gozo dos Benefícios Fiscais referentes à realização, no Brasil dos Jogos Olímpicos de 2016 e Jogos Paraolímpicos de 2016”, como está no processo 10010.007681/0316-28, publicado também no DOU.

Gaetano Lops chegou a ter contrato com o próprio Comitê Rio-2016 através da Rio 360 Comunicação, agência de publicidade da qual era CEO, detentora de dois contratos com o comitê. O primeiro (033/2011), de produção de evento, data de 10 de março de 2011, data em que o publicitário ainda era da Rio 360 Graus, que viria a deixar no mês seguinte, em abril, de acordo com reportagens publicadas na imprensa. O segundo contrato da Rio 360 é de 2015, quando a empresa já tinha o controle total do outro sócio, José Victor Oliva (na foto abaixo com Nuzman no jantar para Eduardo Paes em 26/1/2011).

Em 2004, o COB criou a Olympo Marketing e Licenciamento para intermediar os contratos do Pan de 2007. Com Carlos Arthur Nuzman na administração e Leonardo Gryner como diretor geral. Em 2015, reportagem de Gabriela Moreira na ESPN Brasil mostrou que o COB perdoou dívida de R$ 939.658,51 (novecentos e trinta e nove mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e cinquenta e um centavos) da Olympo com a entidade. Na correspondência apreendida pela Receita Federal, Gryner pedia o perdão para Nuzman por escrito e dois dias depois o perdão é concedido. Logo após o Pan, o Tribunal de Contas do Município do Rio identificou, entre outros casos, um aumento não explicado de gastos relativos às transmissões dos jogos de R$ 33 milhões para R$ 95 milhões, verba administrada pela Olympo. No início de 2016, o Ministério Público do Rio de Janeiro chegou a instaurar inquérito para investigar os negócios da Olympo. Em consulta a base de dados da Receita Federal, a reportagem constatou que a Olympo teve as atividades encerradas em 5 de novembro de 2015.

A parceria de Gryner e Nuzman vem de muito antes. Leonardo Gryner foi sócio-fundador da LG Ventura Marketing e Comunicação, aberta no ano de 1998, três anos após Carlos Arthur Nuzman assumir o COB e no ano em que a Sport Media rompeu com o COB e CBV. Aberta e naquele mesmo ano transformada em agência oficial da entidade olímpica e da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), sob a presidência de Ary Graça, e responsável pelos contratos de patrocínios de ambas.

De acordo com os registros consultados pela reportagem, um dos sócios da LG Ventura era Carlos Roberto Osório, que retirou-se da empresa em 2003, e passou a ser secretário-geral do Pan-2007 e posteriormente o mesmo cargo na Rio 2016, até março de 2010.

Atualmente, de acordo com a base de dados da Receita Federal, a LG Ventura tem como proprietária Adriana Gryner, mulher do executivo do Comitê Rio-2016 e sócia dele na ONG TQQ.
Entre 2012 e 2013, a LG Ventura fechou três contratos com a Transpetro, braço da Petrobras, no valor de R$ 2.518.598,05 (dois milhões, quinhentos e noventa e oito mil reais e cinco centavos).

O primeiro em 18 de dezembro de 2012, para “organização do evento anual da empresa”, valendo R$ 1.009.576,05 (um milhão, nove mil, quinhentos e setenta e seis reais e cinco centavos). E no ano seguinte, em 11 de abril, um contrato de R$ 1.470.938,73 (um milhão, quatrocentos e setenta mil, novecentos e trinta e oito reais e setenta e três centavos) para “cerimônia de entrega do navio Zumbi dos Palmares”, além de um terceiro para “criação da campanha e decoração de natal da sede e unidades da Transpetro”, no valor de R$ 38.083,27 (trinta e oito mil, oitenta e três reais e vinte sete centavos).

A Transpetro é um dos maiores alvos da Lava Jato, condição acentuada após os depoimentos e a delação do ex-presidente Sérgio Machado, nos quais relatou os desvios da subsidiária da Petrobras. A Petrobras não foi patrocinadora de primeira hora das Olimpíadas. No entanto, com o rombo nas contas do Comitê Rio-2016, a estatal acertou ao fim dos jogos uma conta de R$ 10,5 milhões para a Paraolimpíada.

Outro Lado:

Leonardo Gryner: A reportagem tentou falar com o diretor do Comitê Rio-2016 através do próprio comitê e da ONG Tem Quem Queira, e quis saber sobre possível conflito entre ser diretor do Comitê Rio-2016 e um dos patrocinadores ter dado verba a uma ONG dele. Perguntou também sobre os termos do acordo e existência de contrato entre a ONG e a Gael comunicação, além de outras questões, mas não houve resposta.

Gael Comunicação: A reportagem enviou e-mail para Gaetano Lops e executivos da Gael Comunicação perguntando, entre outras coisas, se existiu contrato formal entre a empresa e a ONG de Adriana Gryner e qual o valor, sem resposta.

Caixa Econômica Federal: não respondeu.

Embratel: A reportagem enviou questão sobre a empresa ser patrocinadora da candidatura e dos jogos e ter patrocinado a ONG de um diretor do Comitê. A Embratel, através da assessoria de imprensa, respondeu que “o Instituto apoia uma série de projetos e esse, em questão, foi definido há anos, em conformidade com a legislação e sem relação com os Jogos”.

Atualização 5/10: No dia seguinte a publicação da reportagem, a Gael enviou a seguinte nota:

“A Gael Comunicação esclarece que 100% do material utilizado para a confecção das bolsas foi oriundo especificamente do Boulevard Olímpico (espaço que não contou com arenas esportivas), não tendo sido doado pela organização dos Jogos. Pelo trabalho de produção das bolsas, a agência e a ONG TQQ firmaram um valor de compra, dentro dos parâmetros de mercado e que foi executado dentro de total legalidade. A Gael informa também que participou e venceu a concorrência feita pela Prefeitura do Rio de Janeiro para ser a responsável pelo live site, sendo o contrato firmado apenas entre essas duas partes”.

Foto abaixo: Leonardo Gryner e a mulher Adriana

*atualizado em 19 de outubro de 2017