Com discurso de transparência, sucessor de Nuzman no COB contratou empresa do braço direito e diretor da CBJ
Em meio ao mar de lama que desembocou na renúncia de Carlos Arthur Nuzman, Paulo Wanderley Teixeira assumiu a presidência do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). As primeiras palavras em 11 de outubro de 2017 foram como um soco na mesa em nome da moralidade: “Quem não está dentro da conformidade tem que estar. É governança, transparência, compliance, outra realidade. Sou adepto disso. Se não se encaixar está fora”, afirmou.
Sem maiores contestações por parte da imprensa, assim como seus 16 anos à frente da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), seguiu apostando e avançando no discurso da transparência. Poucos meses depois daquele pronunciamento na estreia, foi mais longe. Em artigo no Globo, publicado no último dia 2, não fez por menos:
“Desde que assumi a presidência do Comitê Olímpico do Brasil, no dia 11 de outubro passado, três conceitos passaram a nortear todos os passos da entidade: transparência, meritocracia e austeridade. E esses conceitos vão além do discurso…A experiência que tive à frente da Confederação Brasileira de Judô, a partir de 2001, me faz acreditar que as mudanças implementadas no COB trarão mais credibilidade…” O novo presidente do COB entrou no comitê pelas mãos de Nuzman um ano antes, em 4 de outubro de 2016, quando foi eleito vice-presidente para o quadriênio 2017-2020, em chapa única. Com discurso diferente ao lado do então presidente, expressando sua felicidade por estar com Nuzman na empreitada. “Fiquei muito feliz com o convite para ser vice-presidente do COB”, afirmou então.
Um olhar mais detido na “experiência à frente da CBJ” citada pelo dirigente como referência, através da análise de documentos obtidos através da Lei de Acesso à Informação junto a Infraero, patrocinador da CBJ, se choca com tal discurso de “transparência” e “outra realidade”.
Em um dos papeis, está uma transferência bancária da CBJ no valor de R$ 33.250,00 (trinta e três mil e duzentos e cinquenta reais) para a MCS Marketing Esportivo ltda, com data de 22 de março de 2017. Para pagamento de uma das parcelas de “gestão de marketing de evento internacional da CBJ”. A nota fiscal correspondente foi emitida dias antes, em 13 de março.
A MCS Marketing em questão foi aberta em 27 de julho de 2012 e pertence a Maurício Carlos dos Santos, como mostra a base de dados da Receita Federal. Apresentado em diversas ocasiões pela CBJ como diretor de marketing da entidade.
No entanto, pelas leis que regem as “Entidades Públicas Sem Fins Lucrativos” (EPSL) e enquadram confederações assim como suas relações com patrocinadores estatais, dirigentes não podem ser remunerados por serviços prestados.
No “anexo 3” do contrato entre a Infraero e CBJ, assinado em 10 de julho de 2015, Paulo Wanderley Teixeira se compromete, no item C, que “não remunera, por qualquer forma, seus dirigentes por serviços prestados”.
Diante do documento encontrado, a reportagem enviou para a CBJ a seguinte questão:
Pergunta: Tendo a MCS Marketing Esportivo como sócio Maurício Carlos dos Santos, o pagamento de remuneração para o mesmo não fere a norma de “não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes por serviços prestados”, como está no compromisso da CBJ a patrocinadores estatais?
Através da assessoria de imprensa, a CBJ respondeu que “o Sr. Maurício Carlos dos Santos nunca exerceu cargo de dirigente nesta Confederação Brasileira de Judô”.
Não é o que mostram documentos da própria CBJ obtidos também via Lei de Acesso à Informação na Petrobras, outro patrocinador estatal da confederação.
Em 2013, a CBJ apresentou um “Relatório de Contrapartidas” de patrocínio, onde Maurício Carlos dos Santos é apresentado como “diretor de marketing e eventos internacionais”. Apresentou-o também no cargo de direção da CBJ em releases oficiais da confederação.
Também no órgão oficial da CBJ, “Judô em Revista”, de novembro/dezembro de 2013, o dono da MCS aparece representando o presidente da entidade oficialmente como “diretor de marketing da CBJ”.
A reportagem enviou questionamento também para a Infraero, já que a estatal pagou para a CBJ por serviço prestado que contraria a lei prevista no próprio contrato entre as duas. A resposta da estatal é distinta e se contradiz com a enviada pela CBJ:
“O contrato de patrocínio da Infraero com a Confederação Brasileira de Judô (CBJ) segue todos os normativos da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR) e, com base neles, sempre são solicitadas comprovações dos gastos com o recurso do patrocinador. Cabe destacar que não consta no portal da Receita Federal – Consulta CNPJ e Optante do Simples o nome de Maurício Carlos dos Santos como o proprietário ou sócio da empresa MCS Marketing Esportivo LTDA”.
No entanto, ao contrário do afirmado pela Infraero, na base de dados da Receita Federal, o nome de Maurício Carlos dos Santos aparece como sócio da MCS Marketing.
Diretor da CBJ recebeu verba pública para projetos pessoais e prestadores de serviço eram empregados da própria empresaA nota fiscal emitida pela MCS Marketing pelos serviços de marketing em 2017 é um fato novo na CBJ. Até 2016, as notas pela gestão de marketing e pelos eventos da área eram emitidas pela RDH Comunicação e Promoção, dos sócios Ednei Souza Nogueira e Helem Viviane Gomes de Mello Nogueira.
Como reportagens publicadas na Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo mostraram no fim de 2016 e ao longo de 2017, não existiam evidências de que os sócios que apareciam na RDH prestavam serviços para a CBJ, já que os nomes não apareciam em lugar algum na função, exercida por Maurício Carlos dos Santos.
Embora as notas fossem da RDH, era Maurício que respondia e recebia pela gestão de marketing. Na ocasião, a reportagem perguntou para a CBJ sobre tal fato. A entidade respondeu que os pagamentos pela gestão de marketing eram feitos para a WH Marketing Esportivo. A reportagem replicou que as notas eram para a RDH. A CBJ afirmou então que a “WH Marketing Esportivo/WH Sports é nome fantasia da RDH Comunicação e Promoção Ltda que, desde 2002, presta serviços de assessoria de marketing esportivo para a Confederação Brasileira de Judô”. E a assessoria de Maurício Carlos dos Santos afirmou que “A RDH é empresa legalmente constituída. O senhor Maurício Carlos dos Santos atua como administrador da filial em Belo Horizonte.”
Em 20 de dezembro de 2016, a reportagem mostrou que a situação de Maurício Carlos dos Santos aparecer como diretor de marketing da CBJ e ter empresa prestando serviço para a entidade gerou questionamento por parte da Petrobras.
Na ocasião, perguntado pela reportagem, Maurício Carlos dos Santos afirmou que “não ocupo, nem nunca ocupei nenhum cargo na Confederação Brasileira de Judô”.
Em outras reportagens da Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo, foi demonstrado que Maurício Carlos dos Santos recebeu verba pública através de sua empresa para o programa “Minas Gerais Territórios Esportivos”, realizado entre os dias 6 de março a 29 de maio de 2016, repetindo o projeto e o modus operandi no “Bahia Territórios Esportivos”, que chegou a receber R$ 1.818.000,00 (um milhão, oitocentos e dezoito mil reais) em convênio do Ministério do Esporte.
Através de notas fiscais e contratos, pode se demonstrar que algumas empresas prestadoras de serviço do contratante eram empregados da própria empresa de Maurício Carlos dos Santos.
Lucio de Castro e equipe sempre mandando bem! Obrigado por desmascarar estes corruptos inescrupulosos.
Lucio de Castro e equipe novamente tocando na ferida e expondo as incestuosas relações entre dirigentes esportivos e patrocinadores. Parabéns!
Caro Lúcio, o que dizer, sempre brilhante, boa troca no Esporte brasileiro, saiu o Cínico, entrou o cara de pau