“Operação Ponto Final” pode ter efeito inédito na Lava Jato além de apontar para Alerj e Olimpíadas Rio 2016
Contratos com o Comitê Rio 2016, deputados da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) e Jorge Picciani, presidente da casa. São alguns dos caminhos na sequência da “Operação Ponto Final”, desecandeada no último domingo, com nove pedidos de prisão preventiva, três de prisão temporária e 30 mandados de busca e apreensão. E além desses, um outro desdobramento único ao longo de toda a Lava Jato: pela primeira vez em toda investigação, os resultados poderão ter consequência direta e imediata na vida prática e no cotidiano do cidadão comum.
De acordo com o andamento das investigações e da denúncia na justiça, a operação poderá quebrar um histórico de décadas de promiscuidade entre o poder público e a Fetranspor (Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro) no estabelecimento do preço das passagens de ônibus no Rio de Janeiro. Entre os detidos, está Jacob Barata Filho, do grupo que domina o setor e filho do homônimo conhecido também como “Rei dos Ônibus”. O esquema envolveu pagamento de propinas de R$260 milhões entre 2010 e 2016. Só para o ex-governador Sérgio Cabral, preso desde novembro, foram destinados R$122 milhões. Rogério Onofre, ex-presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do Rio (Detro), que tinha poder de decisão sobre o aumento da tarifa dos ônibus, teria recebido R$44 milhões.
Se toda ação anticorrupção opera no longo prazo contra perdas do contribuinte, a “Ponto Final” se notabiliza por poder a vir incidir no dia a dia do carioca. Uma das pontas investigada é a distorção nos reajustes das tarifas. Como exemplo, no radar da Força Tarefa do Ministério Público Federal (MPF-RJ), está sendo visto um aumento de 7% sem justificativa técnica, que apontava para 2% de reajuste.
Outras investigações em andamento referem-se a concessão de benefícios para os empresários do setor, retribuídas com propinas, como ausência de licitações, reajuste do valor das passagens acima do previsto e isenções fiscais no IPVA e ICMS do diesel, por exemplo.
Além do efeito mais direto no bolso do cidadão no que diz respeito ao transporte público, cogita-se que a investigação na Fetranspor pode gerar uma espécie de “Lista da Odebrecht” fluminense, com aparecimento de boa parte dos deputados da Alerj e do presidente da casa, Jorge Picciani, este já citado em outro desdobramento da Lava Jato que passou pela Fetranspor, a “Operação Quinto de Ouro”.
Já as Olimpíadas do Rio podem estar entre as causas da manutenção das contribuições para Sérgio Cabral mesmo depois dele deixar o poder, em 2014. De acordo com o procurador Eduardo El Hage, que comanda as investigações da Lava Jato no MPF-RJ, “Cabral manteve influência política forte mesmo depois de ter concluído o mandato”.
As digitais do conhecido empresário e família estão em acordos de alto valor do Comitê Rio 2016As relações da família Barata com o Comitê Rio 2016 foram mostradas em primeira mão pela Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo em 6 de abril ( http://agenciasportlight.com.br/index.php/2017/04/06/jacob-barata-de-rei-dos-onibus-no-rio-a-imperador-no-reino-de-nuzman/ ). As digitais do conhecido empresário e família estão em acordos de alto valor do Comitê Rio 2016 (CoRio). Três diferentes empresas com participações do mesmo grupo foram utilizadas em dez assinaturas, entre contratos e adendos, pelas duas partes. Uma dessas pessoas jurídicas foi aberta dois meses antes da assinatura. E tendo como objetos que transitam entre “consultoria” e prestação de serviço”. Jacob Barata, pai do empresário preso, é o número um dos negócios de transportes no Rio de Janeiro e está citado na colaboração premiada de Jonas Lopes de Carvalho Júnior a qual a reportagem teve acesso e que deu origem a “Operação Quinto do Ouro”.
Em 17 de julho de 2015, foi formado o “Consórcio Rio de Transportes”, com participação de David Ferreira Barata (filho de Jacob Barata) como administrador e tendo como demais sócios a União Transporte Interestadual de Luxo S/A (Util), a Reitur Turismo ltda, e a Fácil Transportes e Turismo ltda. Das três empresas que formam o “Consórcio Rio de Transportes”, duas tem os Baratas na composição societária (Útil e Fácil). Jacob, David, Rosane e Beatriz estão na Util. E além deles, Jacob Barata Filho está também na Fácil, que tem ainda, além de outros, a Jacob & Daniel Participações. Assim, o consórcio foi constituído prioritariamente com comando da família que detém a maior parte do controle do setor no Rio de Janeiro.
Dois meses depois de formado, o “Consórcio Rio de Transportes” já assinava o contrato (815/2015) com o Corio. Em 14 de setembro de 2015, com o objeto de “consultoria de serviços de transporte terrestre de passageiros para apoiar o Rio2016 na entrega do planejamento das operações de serviços de ônibus para a adequada realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos”, no valor de R$ 1.900.000,00 (um milhão e novecentos mil reais). Em 31 de março de 2016, um novo contrato (126/2016) seria assinado, com o objeto de “prestação de serviços de transporte de passageiros por meio de disponibilização de ônibus com motoristas”, no valor de R$ 110.834.890,65 (cento e dez milhões, oitocentos e trinta e quatro mil, oitocentos e noventa reais e sessenta e cinco centavos). Esse contrato sofreria dois adendos: um em 25 de julho de 2016, para “ampliação do escopo dos serviços” e outro em 2 de agosto, para “redução do escopo inicialmente contratado”. A reportagem não teve acesso as eventuais mudanças no valor nesses adendos.
Em 9 de maio de 2016, portanto já com o “Consórcio Rio de Transportes” ativo e assinado com o CoRio, a União Transporte Interestadual de Luxo S/A (Útil), empresa dos Barata e que faz parte do Consórcio, obtém um contrato individual (559/2016) com o comitê, para “contratação de sociedade com experiência na prestação de serviços de recrutamento, seleção, contratação e fornecimento de Motoristas de Automóveis”. A reportagem não teve acesso ao valor do contrato mas em 2 de agosto de 2016, houve um adendo neste contrato com “redução de escopo gerando tambem redução do valor total do contrato”.
No mesmo 9 de maio, a Útil assinou com o comitê (560/2016) para “contratação de empresa com experiência na prestação de serviço de coordenação de profissionais que atuam como motoristas, com suporte administrativo”. E em 3 de agosto o contrato também teve adendo com “redução de escopo gerarando tambem redução do valor total do contrato”. Assim, os Barata obtiveram contratos com o CoRio através do “Consórcio Rio de Transportes” criado pouco antes da assinatura e separadamente através de uma empresa participante do mesmo consórcio. Ou seja, nesse jogo de ganha-ganha, os Barata tinham contratos com o CoRio através do “Consórcio Rio de Transporte” e individualmente com uma das empresas participantes do consórcio, a Útil.
Mas a área de influência da família no comitê não parou por aí. Em 7 de outubro de 2015, a Riopar Participações assinou o contrato 1306/2015 com o CoRio para “fornecimento de bens e prestação de serviços”. E em 20 de abril de 2016 fechou o contrato 234/2016 para “autorização, referente ao uso dos mascotes, look, pictogramas e selo de parceiro governamental para Riopar produzir uma serie especial de cartões Riocard em comemoração aos Jogos”. A reportagem não teve acesso aos valores.
Na base de dados da Receita Federal constam como sócios da Riopar Participações: André Nolte, Luiz Claudio Cruz Marques e Paulo Chaves Borgerth Teixeira. A empresa se encontra com o clã dos Barata em participação societária na SPTA Holding em Transporte Aquaviário, aberta em 2011 e que tem como sócios, além da própria Riopar: Amaury de Andrade, Carlos Otavio De Souza Antunes, Jca Holding Participacoes Ltda, Alexandre Antunes De Andrade, Jacob Barata Filho e Luiz Claudio Cruz Marques. A JCA Holdings também tem Jacob Barata Filho, Amaury de Andrade e Riopar nos sócios, entre outros. Jacob Barata Filho é ainda membro do conselho de administração da RioPar.
A Riopar é responsável pelo Riocard, o bilhete eletrônico usado no transporte público do Rio de Janeiro. De acordo com o descrito na delação que deu origem a Operação Quinto do Ouro”, Amaury de Andrade é citado como o articulador do pagamento de propina da Fetranspor para os conselheiros do TCE. A reunião que selou o acordo teria sido no escritório de Amaury de Andrade, disse o delator. Ainda de acordo com a delação, cada conselheiro recebia R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) mensais da entidade, fazendo assim vista grossa para eventuais mazelas. Ainda conforme o que está no processo, o presidente da Alerj, Jorge Picciani, teria “contribuído e atuado para a consumação dessa conduta”, referindo-se a estruturação do esquema de propina. A colaboração de Jonas Lopes de Carvalho Júnior diz ainda que “Jorge Picciani sugeriu que o colaborador aceitasse uma contribuição mensal aos conselheiros do TCE-RJ para que o tribunal tivesse boa vontade com o setor na Corte de Contas”.
Jacob Barata é citado na colaboração premiada de Jonas Lopes de Carvalho Júnior, ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCE), que deu origem a “Operação Quinto do Ouro”. De acordo com o depoimento, prestado em 2 de fevereiro de 2017, ao qual a Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo teve acesso, os membros do TCE ganharam propina da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro, Fetranspor, citando nominalmente Jacob Barata e José Carlos Lavoura como os “controladores da Fetranspor”. A delação cita ainda irregularidades na gestão do Riocard, gerido pela Riopar, detentora de dois contratos com a Rio 2016.
O “Rei dos Ônibus” ficou assim conhecido por dominar as concessões no transporte público do Rio de Janeiro, além de outros estados como o Ceará. Em 2010, pela primeira vez foi feita uma licitação para tal exploração. Posteriormente, se revelou que os quatro consórcios formados e que se saíram vencedores tinham modus operandi parecida com a criação do que explorou o transporte nos Jogos Olímpicos: ampla participação de Barata em empresas formadas às vésperas da licitação.
O herdeiro David, à frente do consórcio dos ônibus olímpicos, também esteve envolvido em outro controverso caso: no SwissLeaks foi revelado que mantinha, junto com familiares, recursos em banco suíço e teve o sigilo fiscal quebrado pela “CPI do HSBC”, com a premissa de que “a movimentação financeira poderá revelar a materialidade de delito de lavagem de dinheiro e de crimes antecedentes”. Dos 17 envolvidos no caso com sigilo fiscal quebrado, quatro eram membros da família Barata: Jacob Barata, Jacob Barata Filho, David Ferreira Barata e Rosane Ferreira Barata. No entanto, naquela que ficou conhecida como uma das grandes histórias de “pizza” do Congresso, os “Barata” mostraram a força política de seu lobby: seis desses tiverem os sigilos “desquebrados” pela comissão da CPI, ou seja, voltou-se atrás da decisão de quebrar o sigilo destes. Entre esses seis, os quatro da família Barata. A abertura do precedente enterrou a CPI. A família Barata também aparece nos “Panama Papers” com participação em três empresas offshore.
Empresários do setor de ônibus citados na colaboração de Jonas Lopes de Carvalho Júnior não são os únicos do processo que obtiveram ampla gama de contratos com o comitê de Nuzman. Existem participantes não apenas citados mas apontados como “partícipes da organização criminosa”. Personagens da reportagem publicada na Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo em 3 de fevereiro último (http://agenciasportlight.com.br/index.php/2017/02/03/republica-de-mangaratiba-de-cabral-ganha-milhoes-no-comite-presidido-por-nuzman-e-descumpre-normas/ ). Integrantes da “República de Mangaratiba”, beneficiários de inúmeros contratos com o CoRio, com o governo estadual de Sérgio Cabral e com a prefeitura de Eduardo Paes.
Ontem, após a “Operação Ponto Final”, a Fetranspor distribuiu nota informando “que colabora com as autoridades policiais e está à disposição da Justiça para os esclarecimentos necessários”.
Na ocasião da publicação da reportagem que mostrava os contratos do Comitê Rio 2016 com as empresas dos Barata, no dia 6 de abril, os citados responderam assim:
RESPOSTAS – OUTRO LADO:
COMITÊ RIO 2016 – “Tínhamos que fazer contratos diferentes para o fornecimento de ônibus, fornecimento de motoristas e aluguel de ônibus de turismo (em geral a Util) para transporte das comissões do COI e de convidados em eventos com protocolo integrado com o COI. O contrato com o Consórcio Rio Transporte tinha esse escopo amplo porque a entrega esperada era a mais ampla possível. Além de fornecer todos os ônibus usados no sistema de transporte dos jogos, eles ainda nos ajudaram no treinamento dos motoristas, montagem das rotas, da escala de horários, manutenção e etc. Portanto ela apoiou a Rio2016 na entrega e no planejamento amplo das operações de ônibus dos jogos”.
JACOB BARATA E EMPRESA ÚTIL:
1- Questão Agência Sportlight – Além do “Consórcio Rio de Transporte” abaixo citado, a “União Transporte Interestadual de Luxo” (Util) e a RioPar obtiveram contratos com a Rio2016. Os três possuem, em sua cadeia de relações societárias, ligações com empresas da família Barata. E o escopo dos contratos com o CoRio tem objetos semelhantes em alguns casos. Gostaria que comentasse, se possível.
R- A Util informa que os serviços contratados foram prestados e esclarecimentos adicionais podem ser obtidos com a Rio 2016. Sobre a Riopar, a resposta será encaminhada pela assessoria da Fetranspor/Rio Ônibus.
Questão 2- Sobre Jacob Barata e Amaury de Andrade estarem citados na “Colaboração Premiada” de Jonas Lopes de Carvalho Júnior:
R- A resposta será dada pela Fetranspor/Rio Ônibus, que recebeu essa mesma demanda.
FETRANSPOR:
Questão 1) Sobre a “colaboração premiada” de Jonas Lopes de Carvalho Júnior ao MPF, que deu origem a “Operação Quinto de Ouro”, onde a Fetranspor e alguns de seus dirigentes estarem citados por terem pago vantagem ilícita para membros do TCE.
R- A Federação de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) nega o envolvimento em práticas ilícitas e esclarece que, no decorrer da investigação, será comprovado que nenhum membro da Federação participou de qualquer irregularidade. A Fetranspor está permanentemente à disposição das autoridades, de órgãos de controle e fiscalização e da população para prestar todos os esclarecimentos necessários.
Questão 2) Sobre o fato de na mesma colaboração, José Carlos Lavoura e Jacob Barata serem citados como “os controladores da Fetranspor”:
R- A Fetranspor, como instituição federativa, não tem “controladores”. José Carlos Lavouras é integrante do Conselho da Fetranspor. Jacob Barata é empresário. Não há qualquer acusação contra o empresário nestas delações. Há apenas uma citação de que seria “o principal empresário do setor”, o que está longe de ser considerada uma acusação.
Questão 3) Sobre o dirigente da Fetranspor Amaury de Andrade ser citado:
R- Amaury de Andrade é integrante do Conselho da Fetranspor. No decorrer da investigação será comprovado que nenhum membro da Federação participou de qualquer irregularidade.
RIOPAR-
“A RioPar esclarece que, por solicitação das autoridades públicas e do Comitê Olímpico Brasileiro, foi firmado o contrato 234/2016, de licença de marca, para a elaboração do Cartão Jogos, destinado ao público dos Jogos Olímpicos – conforme compromisso assumido pelo Estado junto ao Comitê Olímpico Internacional. Vale destacar que a RioPar não obteve vantagem financeira, uma vez que não houve pagamento pelo serviço, por tratar-se somente de autorização para uso de imagem.
A RioPar informa ainda que o contrato 1306/2015 refere-se à compra de passagens para o grupo de trabalho envolvido na preparação e nas competições dos Jogos Olímpicos, e que foram utilizadas em todos os meios de transportes públicos no Município do Rio. Também neste caso, não houve vantagem financeira para a RioPar”.
Lúcio vc é o melhor cara sem medo .este a cara msm Parabéns
Lucio, precisamos do seu jornalismo que bota o dedo na ferida, obrigado…