Prestação de contas revela projeto entre amigos de diretor da CBJ
Uma ação entre amigos e funcionários do diretor de marketing da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), Maurício Carlos dos Santos, está por trás da cadeia de empresas contratadas para execução de um evento pago com dinheiro público. É o que revelam as notas fiscais e os contratos do programa “Minas Gerais Territórios Esportivos”, realizado entre os dias 6 de março a 29 de maio de 2016.
O Raio X da prestação de contas, obtida pela reportagem através da Lei de Acesso à Informação, revela um quadro de fornecedoras terceirizadas de serviços abertas após a aprovação do projeto e empresas contratadas cujo sócio é o gerente da empresa do contratante.
Reunido em 1º de outubro de 2015, o Comitê de Patrocínio do Estado de Minas Gerais aprovou a concessão de R$ 2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil reais) para a ação, desenvolvida com o propósito de levar durante quatro dias a prática de algumas modalidades esportivas em 13 cidades do estado (Ipatinga, Governador Valadares, Teófilo Otoni, Almenara, Montes Claros, Corinto, Pato de Minas, Uberaba, Patrocínio, Lavras, Juiz de Fora, Ponte Nova e Belo Horizonte). A serem pagos pela Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (CODEMIG) para a proponente e responsável pela execução do projeto: a MCS Marketing Esportivo, de Maurício Carlos dos Santos, como está na ata do comitê.
O contrato e o “Formulário de Solicitação de Patrocínios” mostram que dez por cento ou R$ 230.000,00 (duzentos e trinta mil reais) foram pagos para a MCS Marketing esportivo a título de “gestão operacional”.
Mas a maior parte do montante, distribuído em gastos discriminados como “produção e operacionalização”, no valor de R$ 1.363.267,24 (um milhão, trezentos e sessenta e três reais e vinte quatro centavos) está ligada a empresas cujos sócios revelam a ação entre amigos e funcionários de Maurício Carlos dos Santos.
A Export Produção de Eventos Esportivos está diretamente relacionada a Maurício Carlos dos Santos. A reportagem obteve notas fiscais pagas pela MCS para a Exports referentes a produção no valor de R$ 687.437,99 (seiscentos e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e sete reais e noventa e nove centavos). A maior beneficiária dos pagamentos de todo o projeto “Minas Gerais Territórios Esportivos”.
Ocorre que a empresa é registrada em nome de Rodrigo Ferreira Barreto. Em uma rede social de contatos profissionais, Linkedin, Rodrigo Ferreira Barreto se apresenta como gerente administrativo da WH Marketing Esportivo, empresa que, embora não emita as notas pela gestão de marketing da CBJ e não tenha Maurício Carlos dos Santos entre os sócios registrados, aparece em diversos documentos da CBJ como sendo de Maurício Carlos dos Santos e a gestora de tal área na confederação.
Mas os vínculos entre Maurício e Rodrigo não param na apresentação em rede social. Estão formalizadas na própria nota fiscal da Exports, onde, embora um seja o tomador de serviço e o outro o prestador, ambos aparecem com e-mail da mesma empresa: @whesportes.com.br.
Há ainda outro fato que explicita didaticamente a cadeia da ação entre amigos e, por tão evidente, evidencia as falhas de fiscalização por parte do governo de Minas Gerais: é Rodrigo Barreto, na condição de gerente da WH (no caso, falando em nome da MCS, de Maurício Carlos dos Santos), que escreve no dia 19 de novembro de 2015, para uma diretora da Codemig, patrocinadora do projeto, sugerindo a forma de pagamento para facilitar as contratações dos prestadores de serviço que a WH iria fazer. Ou seja: fala em nome da empresa que irá contratar a própria empresa.
A reportagem perguntou a Maurício Carlos dos Santos sobre o gerente da empresa dele ser beneficiário através de outra empresa de um contrato de prestação de serviços e teve como resposta que “não há vínculo de emprego entre a MCS e os sócios da Export Produção de Eventos. Há uma relação de prestação de serviços desde 2012”. A reportagem tentou contato com Rodrigo Ferreira Barreto, sem resposta.
Existem outras pegadas daquele que consta como dono da Exports, Rodrigo Ferreira Barreto, em sua relação com Maurício Carlos dos Santos: em alguns contratos entre o dono da MCS e terceiros, Rodrigo aparece como testemunha da MCS.
E mais: em alguns contratos da CBJ, o representante é um membro da WH: o mesmo Rodrigo Ferreira Barreto. É assim entre CBJ e o Hotel Stella Maris, em Salvador, onde se realizou a “Assembleia Geral Ordinária da Confederação”, entre 13 e 16 de fevereiro de 2014. No verão baiano, já quase em ritmo de carnaval, que naquele ano seria 10 dias depois, a CBJ pagou a despesa para 50 convidados em 37 quartos. Dois deles foram cortesia do hotel. Uma suíte de luxo para Paulo Wanderley Teixeira e outro quarto para Maurício Carlos dos Santos. Convidados, os diretores da Confederação Panamericana de Judô, Fernando Ibanez e Luis Chevez foram alojados em apartamentos de luxo, com uma recomendação: “próximo ao apartamento de Paulo Wanderley”. Total do gasto da CBJ, organizado diretamente por Rodrigo Ferreira Barreto e a WH, com nota apresentada na prestação de conta da Infraero, R$ 49.517,31 (quarenta e nove mil, quinhentos e dezessete reais e trinta e um centavos), assim como os R$ 31.381, 57 (trinta e um mil, trezentos e oitenta e um mil e cinquenta e sete centavos) gastos em passagens aéreas para os convidados a Salvador.
Os R$ 687.437,99 (seiscentos e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e sete reais e noventa e nove centavos) recebidos pela Export foram assim pagos: R$ 180.183,33 (cento e oitenta mil, cento e oitenta e três reais e trinta e três centavos) na nota fiscal 094, de 9/3; R$ 180.183,33 na nota fiscal 097 de 21/4; R$ 180.183,34 na nota fiscal de 099 de 22/6; R$ 146.888,00 (cento e quarenta e seis mil, oitocentos e oitenta e oito reais) na nota fiscal 101 de 23/6.
Uma outra empresa chama a atenção entre as terceirizadas do projeto: a “Rodrigo Quintão de Castro”, com título fantasia de HTE (Hosting, Travel e Events Logistic e Solutions). Aberta em 17 de novembro de 2015, portanto 45 dias depois da aprovação do patrocínio pelo respectivo comitê do governo mineiro. Abriu e já abocanhou pagamentos do contrato que já estava em vigor da MCS com o governo mineiro.
Não bastasse a data de abertura posterior ao projeto, o dono também tem ligações comerciais com Maurício Carlos dos Santos. Nos mesmos documentos onde Rodrigo Barreto aparece como representante da WH para pagamento do Hotel Stella Maris para a citada assembleia da CBJ, Rodrigo Quintão também consta ligado a WH.
Maurício Carlos dos Santos repetiu para a reportagem sobre a prestação de serviço da HTE a resposta dada sobre Rodrigo Ferreira Barreto: “Da mesma forma, não há vínculo empregatício entre os sócios da HTE e a MCS. A empresa HTE é uma agência de viagem que presta serviços para várias outras empresas”. A reportagem tentou contato com Rodrigo Quintão, sem resposta.
E no pagamento de hotéis em diversas cidades pelas quais o projeto passou, a fatura é fechada pela MCS. Tendo como representante Rodrigo Quintão, embora este apareça em outra situação recebendo do projeto pela HTE. No “relatório financeiro” da prestação de contas da MCS, a HTE aparece recebendo R$ 31.474,96 (trinta e um mil, quatrocentos e setenta e quatro reais e noventa e seis centavos) pela contratação de hospedagem e passagem aérea só na etapa de Belo Horizonte do projeto.
Além da Export, uma outra empresa fica com parte significativa dos gastos por “produção do evento e locação de materiais e serviços”: a Interação Produção e Eventos, com sede em Vitória (ES), mesma cidade do presidente da CBJ, Paulo Wanderley Teixeira. No portfólio da Interação, aparece a participação da Interação em um evento da CBJ, o desafio Brasil X Cuba de judô, realizado em Vitória no ano de 2014.
Nas notas fiscais emitidas pela empresa relativas ao projeto, a reportagem encontrou R$ 675.829,25 (seiscentos e setenta e cinco mil, oitocentos e vinte nove reais e vinte cinco centavos), assim distribuídos: nota fiscal 403, 27/4/2016: R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais); nota fiscal 408 de 23/6: R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) e nota fiscal 416 de 28/6: R$ 225.829,25 (duzentos e vinte cinco mil, oitocentos e vinte nove reais e vinte cinco centavos). Nessas notas fiscais, a Interação apresenta como serviço prestado a locação de materiais, entre eles tatames e quimonos, além de equipamentos de infraestrutura. Fernanda Larica, sócia da Interação, respondeu que “os preços constantes na planilha aprovada e executada estão de acordo com os valores praticados no mercado, ficando a Interação à disposição para esclarecer qualquer item indicado”.
A reportagem tentou contato com a Codemig através de diferentes diretorias, sem resposta.
Mais uma descoberta… Parabéns pelo trabalho. Agora é aguardar a repercussão.