Sarmiento explica a defesagem dos nossos treinadores e o sucesso dos hermanos
Foi um show de horror. A bola não parava de entrar. Dói só de lembrar. Não há um brasileiro que não conte o mesmo: com 30 minutos do primeiro tempo, a agonia virou súplica para que aquilo acabasse.
Era o futebol, uma das mais valiosas faces de nossa alma e de nossa identidade sendo massacrado dentro de casa.
Anos de glória pisoteados. Podia ter sido pior. A Alemanha nos poupou de fazer um olé histórico para ser lembrado através dos tempos. Por compaixão.
Daquelas coisas que não tem remédio, não tem reparação.
Assim que tudo acabou, começou o divã. Tardio. Muitas vezes oportunista. De muitos daqueles que falavam que o Juca e o Seu Zé eram chatos porque apontavam nossas mazelas. Mas obviamente era necessário. Era fundamental começar de novo, repensar tudo.
Nesses momentos, a coisa sempre se desenha assim: o novo pede passagem, a necessidade de reconstruir grita, e o que representa o que faliu se agarra a alguma farsa pra tentar manter o tal status quo.
Pois de noite ligo a televisão e está lá, o Pofexô, ele mesmo, Vanderlei Luxemburgo, colérico, gritando que não tinha visto nada de novo, que ele fazia tudo aquilo desde o Bragantino (meu deus…), que tudo não passara de um acidente…
Com sua visão de mundo onde está sempre no centro, nada escapava ao modo peculiar de fazer análise. Sobre a Alemanha, “eu já fazia tudo isso há muito tempo”. O que achou da Holanda? “Isso eu fazia no Palmeiras”. E a Argentina? “Isso já naquela final Bragantino x Novo Horizontino eu aplicava”. E por aí foi.
Os anos se passaram, e o Pofexô, já meio escanteado na nova ordem que começava a dar a cara por aqui, reaparece em programa de TV. Parei pra ver. Sempre tive atração por ver algumas coisas trashs na TV, não seria diferente ver ele ali discorrendo sobre a atualidade do futebol. E ele não decepcionou: seguia, dois anos depois, achando que nada aconteceu na Copa, que o 7 x 1 foi fatalidade…E foi além. Muito além: bateu o martelo que não tem técnico argentino fazendo sucesso por aí, que não são nada demais, que tudo isso ele já fazia…Você já sabe: no Bragantino lá do século passado!
Devia ser meu lapso de memória não lembrar do goleiro Marcelo lá em Bragança atuando como Neuer. De Gil Baiano a lá Lahn, de Pintado fazendo o Schweinsteger e Sílvio sendo Lewandowsky. A única diferença é que nem mesmo a claque geralmente complacente com as reflexões do Pofexô dessa vez se empolgou muito. Olhavam para ele como eu olhava para o “Marcha a Ré” na minha infância. “Marcha a Ré” era um morador de rua que a garotada da área adorava. Quando ele passava, a turma falava: “Marcha a Ré”! E ele engatava a ré imaginária e saia andando de costas. Olhava fascinado e estupefato pro Marcha a Ré naquele período da vida. Era assim, meio estupefatos, que mesmo os amigos fieis olhavam para Luxemburgo quando ele discorria sobre o futebol moderno. Com a mesma cara que eu olhava para o Marcha a Ré.
Não tenho dúvidas que teve um pouco de tudo ali naquele fracasso. A soma de incompetências gerou a catástrofe, que obviamente não se faz do dia pra noite. Um 7 x 1 daqueles é obra de anos de descaso, corrupção e atraso. Muitos falaram na gestão bandida. Com razão. Nessas horas vale sempre separar. O critério é simples: se o sujeito já falava nisso tudo antes da tragédia, tem legitimidade para tal. Se foi só depois da casa cair, se antes aplaudia e estava lambendo botas do poder, é oportunismo. Simples assim.
É claro que tem tanto disso naquele fracasso, dos anos dessa CBF que ainda comanda. Poderíamos discorrer muito sobre tal, mas já se disse e se dirá. Mas só isso não explica. Afinal, tem o caso clássico e que não permite dúvidas: e a Argentina, que vive as mesmas mazelas com a AFA e dentro de campo conseguiu se organizar, bater de frente com seus adversários, enfrentar a Alemanha? Aliás, até a Argélia conseguiu ao menos enfrentar a Alemanha, arrastar o jogo para uma prorrogação, mostrando muito mais organização do que o Brasil…Então só as mazelas administrativas não dão conta de tudo. Adiante.
Se a Argentina, tendo a CBF que tem na figura da AFA, piores ainda porque sem a mesma força financeira, chega a uma final e tem chance de bater a Alemanha, se a Argélia joga duro, é que alguma coisa acontece também nas quatro linhas. E já vinha acontecendo no mundo inteiro no que diz respeito a organização do jogo. Tendo Guardiola como símbolo maior mas outros em diferentes ideias. Em resumo muito frouxo, estávamos diante de um novo tempo. De compactação, de posse de bola ou de contra-ataques mortais, de participação de todos e funções no lugar de posições, de marcação lá na frente, enfim, tudo aquilo que muitas vezes é dito de maneira bem chata com por alguns como se estivessem falando dos resultados do acelerador de partículas e detivessem o último cálice do conhecimento.
Não entenda as palavras acima como crítica a novos caminhos da análise do futebol. Assim como dentro das quatro linhas, novos conceitos e referenciais foram necessários. Só não precisam ser ditos como quem anuncia a última fórmula que explica a equação jamais revelada. E assim, nesse quase pedantismo de quem crê nisso, chegamos a expressões patéticas como “o último terço do campo”, repetido em demasia, e que expressa bem esse espírito de alguém achar que inventou a roda. “Último terço do campo” embute essa aura de religião que alguns querem dar a simples explicações de…futebol. Se seguirem falando isso, vou aproveitar, patentear e fundar uma igreja, a “Santa Igreja do Último Terço”. Prevejo ganhos milionários, incautos adoram novas palavras para expressarmos o que sempre existiu. Afinal, ou muito me engano e eles realmente sabem muito mais do que todos nós, ou o ridículo “último terço do campo” é só a bem mais coloquial “última parte”. Ou ali perto da grande área, aquilo que os antigos chamavam de zona do agrião, dali pra frente. É que um dia um desses técnicos em tom professoral falou e o resto, achando moderno, considerou o máximo da sapiência! E vão além: dizem que o jogo se resolve no último terço. E mais: que predominam os sistemas táticos e o talento é só para o tal último terço na atualidade. Perdoai, ó Pai, não viram Zico jogando e decidindo ali no meio de campo, antes do último graal, perdão, último terço. Não viram nem Iniesta jogando hoje, ou viram mas a lavagem foi tão grande que repetem as bobagens. Mas repito: isso não invalida a necessidade desse novo olhar para a análise. Fundamental.
O “Último Terço do Campo” é tão patético que até me desviei do assunto! (o que leva alguém a falar em “Último Terço do Campo”?).Tem também o não menos ridículo “propor o jogo”. Ora, com efeito, é claro que ninguém em sã consciência acha que alguém “propõe o jogo”. Nem no carteado. Imagino, pelo sentido do que escuto, que o tal propor o jogo é quando alguém manda no jogo. Então claro que não é propor jogo algum, quem faz isso “impõe o jogo” e não propõe droga nenhuma. Mas deixemos isso pra outro dia.
Pois bem, falávamos de razões para o 7 x 1, que vão além da gestão trágica fora de campo. Isso é mais um fator entre tantos. A citada Argentina mostrou que é possível ser caótico fora e bom dentro. E aí chegamos a tal defasagem que vivemos, no vácuo tático que transformou o futebol mais lindo de todos em monótona sucessão de chutões, contra-ataques, laterais com a mão e jogar por uma bola parada. Sempre espalhados no campo dispersos como num piquenique. Não sabíamos mas fazer o que sempre soubemos, aquilo que Guardiola resumiu quando o 7 x 1 se prenunciou, naquele 4 x 0 do Barça contra o Santos: “vocês jogavam assim”, tão cruel quanto carinhoso, tão verdadeiro quanto duro.
Mais uma vez uma imensa quantidade de hipóteses se faz possível para responder: em que momento estabeleceu-se esse vácuo, quando perdemos a mão? O debate é bom e aceita várias possibilidades. Obviamente, defendo a minha hipótese, que, de forma alguma é exclusiva ou conclusiva, e, muito pelo contrário, pode ser complementar. Sem romantizar uma seleção ou tempo, afinal, futebol sempre foi e sempre será espetacular em qualquer tempo, ao contrário do que podem pretender alguns saudosistas “no meu tempo”, (pronto, já teve paulada nos modernos e nos saudosistas também, estamos iguais, numa prova que nenhum dos dois sem olhar o outro é bom), creio mesmo na hipótese de que 82 foi realmente um marco nisso.
Minha hipótese se fundamenta no ciclo seguinte, ao vermos Telê tragicamente abandonando algumas convicções, perdidas naquele não menos trágico Sarriá. Quatro anos depois, no México 86, tínhamos Elzo e Alemão tais e quais dobermans pontificando o meio de campo. O trauma se espalhou em nossos campos. Por todos os nossos técnicos. No lugar do volante, do latim, “aquele que voa”, ficamos com o cabeça de área, talhado para ser mesmo só a cabeça daquela zona e ficar por ali, destruindo. Doberman, pitbull, chefe da Swatt, chamou-se de várias formas. Todas contemplando geralmente um botinudo que existia para destruir. Muitas vezes dois. A era do maior meio de campo que vi jogar, com Andrade, Adílio e Zico acabava. E uma era de trevas se abria.
Nos anos seguintes, lá fora, já se desenhavam novas concepções. Enquanto concentrávamos ciborgues na frente da área, lá fora já se entendia que o jogo começava por ali. E nesse ponto fundamental de divergência, foi se abrindo um abismo. E se ampliando ao campo todo.
Como por aqui o feio batia com o feio dentro de campo, quem ganhava dentro disso ficava superestimado. Supertécnico. E incrivelmente não se via o que já ocorria lá fora. Até a bola que corria na Inglaterra tinha ido pro solo no lugar dos chutões. Serão eternos devedores de Arsene Wenger, o sósia do Costinha, por isso. E aqui fizemos o movimento contrário. Como a mediocridade gera filósofos símbolos desses tempos, fomos sendo cúmplices de quem ironizava o bom futebol. E como a crônica não chega a ajudar muito, por mais de dez anos ouvimos o mais ridículo dos embates, que voltava todos os dias e por incrível que pareça ainda teima em voltar: “ganhar ou jogar bonito”, quando obviamente a questão nunca foi jogar bonito e sim jogar bem. Jogar bem na convicção de que jogar bem é o caminho mais curto pra vitória. E nessa aceitação que só os tempos medíocres permitem, aceitamos um pragmatismo falso que garantia ser caminho mais curto para a vitória o vale tudo dentro de campo. Que aquilo iria garantir a vitória e no final isso é que contaria. Como se isso assegurasse o sucesso. E não o jogar bem, de maneira suja transformado em um tolo “jogar bonito” que pretendia dar ares de circo ao futebol, como se esse não jogar bem fosse o melhor caminho para ganhar.
Não há símbolo maior desses tempos, desse pragmatismo que tanto dano nos causou do que seis anos de Dunga no comando de uma seleção brasileira.Não há símbolo maior desses tempos, desse pragmatismo que tanto dano nos causou do que seis anos de Dunga no comando de uma seleção brasileira. Sim, creio que ainda teremos que voltar a isso: foram seis anos de Dunga. E isso, por si só, diz muita coisa. Resume bem ao mesmo tempo tanto a tragédia de nossa gestão quanto a tragédia do vão tático por aqui. Com a complacência dos de sempre. E com o mais ridículo dos argumentos, aquele “mas perdemos da Holanda jogando melhor em 2010. Se não fossem aqueles 45 minutos…”. Desde 90 seguimos assim. De tragédia em tragédia, como pequenos lapsos de glória, muito mais por talento individual, “se não fossem aqueles 45 minutos…”. Se vale para Dunga, deveria valer para Lazaroni. “Se não fossem aqueles 45 minutos…”, e teríamos ganho da Argentina em 90, “jogamos melhor o primeiro tempo”. Apesar da copa ridícula, como em 2010, “se não fossem aqueles 45 minutos…”.
Nesse mesmo tempo, técnicos argentinos se multiplicavam pelo mundo. Enquanto o Pofexô gritava contra eles nos programas, Pekerman, Sabella, Pochettino, Simeone, Bielsa, Sampaoli, Pizzi, brilhavam por aí, para não falarmos em Gareca, Martino, Ramon Diaz, já que estes tateiam ainda, mas mesmo assim são mais sucesso do que os brasileiros. Olha os nomes e onde eles estão, Pofexô, não repete isso, por favor. Periga da próxima vez que falar isso te amarrarem numa camisa de força…
Como toda convicção começa em hipóteses, também tenho lá as minhas para isso, novamente sem pretensão de dono da fórmula do acelerador de partículas ou de detentor do segredo do “último terço do campo”. Não pode ser ao acaso que os técnicos do país vizinho tenham se adaptado melhor aos novos tempos do futebol, de tempos tão táticos e onde é preciso um tanto de capacidade de pensar, de ter concepções, de criar, de formular conceitos. Me permito nem entrar no tão débil argumento do idioma como causa, com o qual muitas vezes tentam encerrar a questão. Seria menosprezar muito a capacidade de quem tem um mínimo de massa cinzenta. Adelante. Quem quiser se enganar que se engane, não parece ponto digno de abrir parêntesis.
Estamos falando de capacidade de pensar, ter concepções, criar e formular conceitos. Desenvolver sofisticadas estratégias. E então minha hipótese não chega a ser tão complexa e sofisticada. Para se chegar a ter algum sucesso nesse cenário mais sofisticado de elaboração em que o futebol se transformou, é preciso alguma sofisticação na elaboração, parece tão óbvio. É aqui que chegamos a Sarmiento. E ao contraste com a eterna negligência de nossas elites em desejar e querer que ensino de qualidade não seja para todos. Em tempos de PEC da Morte, o que se anuncia pode ampliar ainda mais esse buraco, com mais gerações que não verão ensino de qualidade, alargando o fosso.
Sarmiento foi dom Domingo Faustino Sarmiento. Longe de ser exemplo e modelo como ser humano. Racista, preconceituoso, com todos os vícios de um homem do seu tempo e outros mais. S´ó uma ressalva deve ser feita e um crédito: com ele, apesar disso tudo, a Argentina fez o impensável: ainda no século XIX, transformou o ensino para todos, idealizou e realizou o acesso universal, a “educação de príncipes e mendigos”. De uma viagem pelo mundo, trouxe a certeza de que as coisas só andariam quando o ensino primário fosse obrigatório e em escola de qualidade. Dos Estados Unidos, mas precisamente de Massachussets, trouxe a convicção de que o fundamental para o desenvolvimento americano, então em andamento, seriam a crença de educação maciça e a distribuição igual de terras (sim, muitos que admiram tanto os Estados Unidos tem pavor de reforma agrária aqui). Estamos falando em século XIX. Até hoje não chegamos nisso. Educação laica para todos, naqueles tempos, enquanto aqui se propõe hoje tanta bobagem para a educação e nosso Sarmiento é o Alexandre Frota.
A revolução de Sarmiento desembocou no Primeiro Congresso Pedagógico Nacional (1882). Educação como um direito de todos, obrigação do estado. Nem as piores crises econômicas que assolaram os argentinos foram capazes de destruir totalmente a obra de Sarmiento nesse aspecto da educação. Nesse aspecto, frisa-se sempre. Anda-se na bela Buenos Aires e vai se chocando com uma infinidade de livrarias e um povo ávido por leitura. A semente de Sarmiento. Existem problemas tão grandes como os daqui, por vezes até maiores. Mas nem a mais sangrenta ditadura do continente, apesar de ter tanto tentado, destruiu completamente a obra de Sarmiento na educação. A educação universal que, no entender de alguns pensadores daquele país, foi “o amalgama que uniu o país”. Parem e pensem na profundidade disso: a educação sendo o amalgama que une um país.
Muitos, progressistas até, adoram evocar a coragem argentina em contraponto a uma “bundice brasileira”. Que lá vão para as ruas, protestam sempre… Não é uma questão de coragem ou bundice. É Sarmiento na raiz, e aqui não nomeio um homem e sim um processo. Alguns tentaram por aqui. Anísio Teixeira, Darcy, Brizola…A mesma tosca camada que adora falar em falta de educação dos brasileiros é certamente aquela que votou em Moreira Franco no lugar de Darcy Ribeiro, um dos momentos mais vergonhosos da história desse país. Meu Deus, teve isso…
Poderíamos ir mais longe. Há muita literatura sobre os dois temas: a revolução de Sarmiento na educação, que gerou uma gente com capaz de raciocínios complexos e foi desembocar, nesse mundo de quatro linhas que hoje requer tal capacidade, nesse predomínio azul e branco entre os treinadores. Um massacre, a despeito do Pofexô achar que não. Como também existem muitos relatos sobre como aqui se destruíram todas as tentativas de educação para todos.
Antes que alguém se arvore também em dizer que falar sobre Sarmiento, sobre um nível cultural atingido maior é constatar que por aqui há uma sub-raça, isso passa longe dessas linhas. Temos uma gente com imensas possibilidades. Iguais as de qualquer um. Do vizinho ao mais distante. Iguais provavelmente não. Maiores, multiplicadas ao infinito na diversidade, nesse caldeirão que gerou essa potencialidade infinita do povo brasileiro. A quem basta apenas a oportunidade, uma classe governante menos tacanha. O mesmo processo de educação universal.
Para quem sempre torce o nariz para uma análise de futebol entremeada com a conjuntura política e histórica, e ainda crê que para se chegar em duas linhas de quatro compactas ou formular a sofisticação do 4-1/4-1 é só formular o 4-1/4-1, lamento dizer que não é só isso. Dramaticamente, o fim dos anos 80, os 90 e o novo século no Brasil, vieram a encontrar no posto de treinadores exatamente aqueles da faixa de idade da geração que estudou nos anos de chumbo ou depois dele. No momento em que tragicamente a educação se esvaiu no país. Se na Argentina ainda existia uma base para segurar a degradação da ditadura, aqui era frágil. Por lá, as escolas, de maneira geral, ainda tinham e tem seu rescaldo de Sarmiento.
Alguns lobotomizados que vão as ruas pedir a volta da ditadura, descerebrados pobres-diabos e robôs, não sabem o quão danoso foi para a educação brasileira aquele tempo de chumbo. Foi com Castello Branco que o governo deixou de ter obrigação de investir um coeficiente mínimo em educação e em saúde. Em dez anos da ditadura militar, entre 1965 e 1975, o investimento em educação saiu de 10,6% para 4,3%. Uma tragédia pela qual respondemos até hoje e pela qual responderemos. E que responde também por esses meninos sem miolos que vão pedir a volta disso. Faça as contas você mesmo. Toda essa geração de treinadores que agora começa a deixar a cena. Não é preciso citar nomes. São exatos os filhos do sistema educacional da ditadura, vítimas de seu desprezo por educação. Vencedores incontestes no vestiário da vida, na mobilização. Mas o jogo se sofisticou…Com todo respeito. Difícil crer no acaso ao tentar entender as razões para não termos acompanhado a sofisticação tática do jogo.
Todas essas linhas trazem algumas hipóteses minhas. Assim se chega a um diagnóstico. Formulando e construindo hipóteses. Para se chegar a uma conclusão, uma hipótese precisa bater de frente, encarar o contraditório, ir pra rua. A única coisa que se pode ter certeza nos elementos dessa equação é que o futebol, assim como o esporte, está longe de ser uma ilha. Muito mais agora, em tempos de globalização, de sofisticações táticas. Tudo isso, obviamente, e por isso é futebol, sempre se levando o fator humano em conta e como o mais importante, não só no “último terço”. Que esse diagnóstico prossiga e se acelere. Não aguentaria outro 7 x 1.
Genial Lúcio, genial!
Como historiador formado recentemente (colei grau em Novembro passado!) e,acima de tudo,ávido pesquisador dos intelectuais sul-americanos do século XIX,fico muito feliz (e espantado) de ver sua análise perpassando pelo crivo da produção do Domingo Sarmiento (e pela atenção que você dá ao ressaltar os aspectos positivos de sua ideologia,como a educação,e negativos,como a denominação de “bárbaros” e “inferiores”).
Fiquei muito feliz mesmo Lúcio! Parabéns!
Obrigado pelo delicioso e profundo texto. E pelo “parêntesis”, que eu, confesso, não sabia que era correto!
Muito boa análise, são teorias muito interessantes e fazem sentido. Eu só fico com uma dúvida: porque fomos tão vitoriosos na década de 90, revelando um Maracanã inteiro de craques e boleiros inesquecíveis, sucesso que se estendeu até meados da primeira década deste século? Será que esses 15 anos de sucesso foram totalmente devidos aos talentos, sem nenhuma participação dos técnicos, sem nenhuma inovação tática? No texto você explica que a decadência começou ao final da década de 80, mas nosso futebol só veio se mostrar desinteressante e ultrapassado a partir da era Dunga (opinião de quem nasceu em 1991). Será que esse “ponto fora da curva” não é longo demais (de 10 a 15 anos)?
Uma outra curiosidade: em que escala a ditadura argentina foi menos danosa ao ensino universal e gratuito do que a ditadura brasileira? O neoliberalismo foi menos intenso nos anos de chumbo hermanos?
Parabéns, Lúcio. Suas análises vão muito além das quatro linhas. A educação é primordial em todos os setores da nossa sociedade. Infelizmente, os dirigentes do nosso país não pensam como você.
Diferenciado. Parabéns!
Lúcio, concordo com quase tudo. Mas há um fato que você, como tantos outros, parece ignorar, ou acredita ser culpa de treinador -no que discordo: o 7×1, como bem disse Vampeta, foi a maior PIPOCADA já vista em 130 anos de futebol. Pipocada que se desenhou ao longo da Copa, com jogadores com nervos em frangalhos chorando por tudo: do hino ao gol marcado. Os alemães eram superiores em tudo – mas o fator determinante para a surra foi piscológico. Abs
Prezado Gabriel Campos, com todo o respeito a sua opinião, ou Lúcio de Castro é um gênio a frente do seu tempo, ou você está com uma visão um tanto quanto defasada.
Veja essas duas opiniões do próprio Lúcio, antes e no dia seguinte ao 7×1
http://espn.uol.com.br/video/421979_para-lucio-de-castro-problema-do-brasil-nao-e-emocional-e-tatico-time-e-pessimamente-treinado
http://espn.uol.com.br/video/424316_lucio-de-castro-detona-oba-oba-durante-preparacao-da-selecao-e-critica-museu-de-horrores-na-cbf
Brasil sempre teve a melhor matéria prima do futebol. Aqui nascia um craque em cada árvore. Os treinadores brasileiros mais vitoriosos foram aqueles que conseguiram tirar o melhor de seus jogadores e/ou juntar o maior número de craques possíveis. Assim a escola brasileira de treinadores se moldou de maneira diferente do resto do mundo, onde precisavam desenvolver um jogo e não deixar a responsabilidade nos pés dos jogadores.
Com o tempo o cenário mudou, aponto dois fatores como os mais importantes: globalização e imigração na Europa.
A primeira tirou a brincadeira de rua (sendo o futebol uma das principais) da formação de grande parte da população brasileira, que passou a ter acesso a outras maneiras de se divertir e ainda não encontrar mais tantos espaços públicos para a prática de um esporte espaçoso. A segunda foi fundamental para levar a Europa no caminho oposto d Brasil. Com as portas abertas para imigrantes, houve uma quebra nas culturas e tradições enraizadas em cada nação europeia, e o aumento da população tem acesso a diversões mais custosas. Nisso as “brincadeiras de rua” cresceram, e em certos lugares nasceram. O Brasil passou então a produzir menos matéria prima de qualidade, mas bem longe de cessar a produção, e os europeus também passaram a ser produtores. Essa boa matéria prima europeia encontrou treinadores que desenvolviam jogo e deu um belo casamento, tendo o 7-1 como a grande lua de mel. Já nosso jogo pró craques, não encontrou tantos craques como antes, decaindo a ponto de tomar uma surra de uma seleção ex-robótica.
Escrita fenomenal!
O brigado pela agradável leitura e profunda reflexão.
Confesso que sempre pensei na involução do nosso futebol atrelado ao nosso atraso educacional mas jamais tive a sua coesão pra explicar.
Parabéns, belo texto!
Muito bom mesmo, parabens.
“Foi com Castello Branco que o governo deixou de ter obrigação de investir um coeficiente mínimo em educação e em saúde. Em dez anos da ditadura militar, entre 1965 e 1975, o investimento em educação saiu de 10,6% para 4,3%. Uma tragédia pela qual respondemos até hoje e pela qual responderemos. E que responde também por esses meninos sem miolos que vão pedir a volta disso.”.
Andrade , Adílio e Zico foi o maior meio de campo da história para a turma do Clipper e arredores.
Lúcido, de doer. Penso que além de tudo ainda dá pistas da gênese da dor de cotovelo que boa parte dos “nacionais” sentem em relação aos hermanos. Como se tal dor houvesse nascido nos gramados e não nos tapetes acarpetados dos gabinetes.
Obrigado, Lúcio.
PS.: Sou Corinthiano, más…”e agora como é que eu fico, sem Zico e sem Maracanã?”
#newmaracanãnão
Grande Lucio, vc faz falta na TV amigo, aquele abraço