O habeas corpus de Nuzman e as diferenças na noção de tempo. “Assim é, se lhe parece”.
Otempo é medido em distintas noções. Parece um ensaio de filosofia mas não é. Na verdade, trata-se do habeas corpus requerido pela defesa de Carlos Arthur Nuzman que pede, em caráter liminar, a soltura do presidente do COB.
Na peça, é destacado que o dirigente precisa de cuidados especiais com a saúde. Com a discrição de que foi submetido a “seríssima cirurgia de dissecção de sua aorta, a impor cautelas especiais”.
Embora obviamente todo paciente submetido a tal cirurgia de fato e evidentemente precise de cuidados com a saúde, não menciona que a cirurgia foi realizada em 2004, quando passou pele emergência do Hospital Samaritano.
E tampouco que, à parte os cuidados especiais que devem ser dedicados, não foram impeditivos para as 19 voltas no mundo que Nuzman gosta de alardear ter dado apenas no processo eleitoral para a candidatura as Olimpíadas do Rio, já cinco anos depois da cirurgia, em 2009. Nem tampouco para que, fato inédito na história olímpica, fizesse questão de acumular as duas presidências, tanto do COB como do Comitê Organizador. Nesse ano corrente, passou a membro do comitê organizador no ali do lado Tóquio. E se candidatou a presidência da ODEPA. Nada era impeditivo.
Curiosamente, esse mesmo ano de 2009, portanto cinco anos depois da cirurgia, é evocado como um espaço de tempo distante já para que puna alguém na peça.
“O paciente jamais exerceu qualquer cargo público e a suposta compra de voto para eleição da cidade do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 envolveria apenas entidades privadas, episódio longevo, ocorrido há cerca de oito anos”.
Aqui não existe qualquer julgamento de procedência ou não do alegado pela defesa. De certo ou errado. Apenas a curiosa constatação sobre a diferente noção de tempo em Nuzman.
Descobre-se que, para a defesa Nuzman, 2004, não citado no habeas corpus como data da cirurgia, foi ontem e definitivo espaço de tempo para justificar uma ação que beneficie o cliente.
Já 2009, cinco anos depois, é um “episódio longevo”, indicativo para uma prescrição de tempo.
Como ensinou Luigi Pirandello, “assim é, se lhe parece”.
Embora destaquem que a “a argumentação do pedido de liberdade de Nuzman não se baseia na questão da saúde”, como está em reportagem do portal G1, apontam que “não é possível que os impetrantes omitam um dado concreto acerca da saúde do Paciente, não apenas pelas responsabilidades da defesa, como também para precatar eventuais consequências graves nesse particular”. Embora não ressaltem também a rotina normal e as várias voltas no mundo que o mesmo Nuzman pode dar após a cirurgia.
A outra curiosidade da peça ao dizer que “o paciente jamais exerceu qualquer cargo público e a suposta compra de voto para eleição da cidade do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 envolveria apenas entidades privadas, episódio longevo, ocorrido há cerca de oito anos” é certamente a justificativa do não exercício de cargo público, sendo assim, eventual ilicitude teria sido na esfera privada.
Somente entre 2007 e 2016, foram assinados 24 convênios entre COB e Ministério do Esporte. Valor total dos convênios: R$ 109.943.080,44 (Cento e nove milhões, novecentos e quarenta e três mil, oitenta reais e quarenta e quatro reais). Dinheiro públicoSem citar também a montanha de dinheiro público envolvido na realização dos jogos.
Somente entre 2007 e 2016, foram assinados 24 convênios entre COB e Ministério do Esporte. Valor total dos convênios: R$ 109.943.080,44 (Cento e nove milhões, novecentos e quarenta e três mil, oitenta reais e quarenta e quatro reais). Dinheiro público. Ínfima porcentagem do que entrou entre patrocínios estatais, financiamento direto dos jogos e verba de loterias.
Mais curiosamente ainda é que a evolução patrimonial de Nuzman, de acordo com o MPF, acompanhou a década dos grandes eventos, pulando de R$ 2 milhões em 2006, passando dos R$ 3 milhões dois anos depois e batendo os R$ 4 milhões entre 2012 e 2013. O ano de 2015 chamou atenção especialmente aos investigadores, quando ultrapassou os R$ 9 milhões. “Ainda, cumpre informar que no ano de 2014, o patrimônio de Carlos Arthur Nuzman dobrou, havendo um acréscimo de R$ 4.276.057,33. Chama a atenção o fato de que desse valor, R$ 3.851.490,00 são decorrentes de ações de companhia sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, conhecido paraíso fiscal”, afirma o MPF.
Sobre tal evolução, o MPF afirmou:
“Nos últimos 10 dos 22 anos de presidência do COB, Carlos Nuzman ampliou seu patrimônio em 457%, não havendo indicação clara de seus rendimentos. E, conforme a seguir narrado, em situação de permanência, Carlos Nuzman mantinha oculto parte de seu patrimônio na Suíça. Nesta grande “jogada”, o planejamento e execução da vinda dos Jogos Olímpicos para o Rio de Janeiro – a todo custo – foi uma das melhores estratégias de capitalização financeira e política para a organização criminosa chefiada por SÉRGIO CABRAL, que pôde multiplicar as possibilidades de ganhos ilícitos com a realização de obras e com os contratos de serviços firmados com outros membros da organização, sempre mediante pagamento de expressivas quantias de propinas aos agentes políticos. Tudo a demonstrar que todos os membros do engendro criminoso agiram articuladamente, de forma organizada e com divisão (ainda que informal) de tarefas, em busca do objetivo comum: buscar meios para atrair investimentos para o Rio de Janeiro e, com isso, a possibilidade de, de um lado, beneficiar os “amigos da Corte” com contratos públicos vantajosos e, de outro, que esses mesmos agentes privados pagar vantagens indevidas (propinas) aos agentes públicos”.
Infelizmente no Brasil não existe interesse em realmente se fazer algo que beneficie o coletivo e sim o individual e alguns indivíduos. Esses senhores mencionado na reportagem bem como outros desse imenso cenário de corrupção do qual não sabemos onde vai parar , são apenas parte ou micro células de um gigantesco sistema de organizações criminosas que tomam conta do dinheiro público, por isso é admirável a coragem do Jornalista Lucio Castro em publicar reportagens de denúncias contra esses ratos que querem posar de mocinho. Isso que é jornalismo . Parabéns também os procuradores que cada vez mais mostram com muita coragem a verdadeira face dos nossos governantes.
Jornalismo sério e justiça fazendo justiça, sem dúvida o caminho da faxina do nosso país.
Meu caro Lúcio de Castro. Meu respeito por quem expõe com coragem as entranhas desse poder paralelo e dos componentes dessa quadrilha. Grande abraço