As aventuras de um cadeeiro: sob o comando de Cabral, “La Catedral” de Benfica promete ser um dos “points” do verão carioca
Eram animados os dias em La Catedral.
A menos de uma hora de Medellín, com vista privilegiada das montanhas colombianas e muito conforto.
Tinha sala de lazer, jogos, de TV e até sauna.
Foi o símbolo maior de um estado de cócoras para um criminoso.
Pablo Escobar recebia amigos, comparsas, prostitutas, jogadores de futebol, familiares na hora em que queria e todas as mordomias possíveis naqueles dias de junho de 1991.
Desaforo dos desaforos, mandara construir a própria prisão para enfim “aceitar” ser preso pelo estado. Deu as cartas até na hora da rendição. Até a fuga um ano depois, em julho de 1992.
A Cadeia Pública José Frederico Marques, mais conhecida como “Benfica”, por estar no bairro do mesmo nome, não chega a ser uma La Catedral. É lá que Sergio Cabral está preso, depois de breve estadia em Bangu 8, entre 17 de novembro de 2016 até 28 de maio último, quando o ex-governador chegou a nova morada onde é hóspede do estado que comandou por 8 anos e que saqueou impiedosamente.
Mas não é forçar a barra se quisermos encontrar alguns parelelos entre o presídio carioca e o colombiano. Que, pelo andar da carruagem e pela ausência de controle e falência do sistema, tendem a crescer. E a eventual chegada de novos figurões, aguardados para breve ou para quando o foro acabar, renova a expectativa de que dias e noites animadas virão na versão carioca de La Catedral.
La Catedral carioca nasceu com o intuito de proporcionar exclusividades para os clientes da Lava Jato. Obra do amigo de Cabral, o governador Pezão, que, findo o mandato e consequentemente o foro privilegiado…Como seguro morreu de velho, transferiu a turma que ali vivia para abrir espaço aos novos presos.
Não sem antes promover uma boa reforma. Acabou com o boi, disponibilizou sanitários e chuveiros nas celas com divisória de parede, e, ironia das ironias, mandou que os colchões que receberam os atletas olímpicos nos jogos de 2016 fossem para lá. Os colchões que acabaram recebendo o patrono dos Jogos, Carlos Arthur Nuzman em sua passagem por La Catedral.
A última notícia que se teve do presídio trouxe a imediata lembrança da prisão particular de Pablo Escobar para todo mundo. Uma sala de home theater com telão de 65 polegadas, caixas de som, blue Ray para 160 filmes…A descoberta, em reportagem do jornal O Dia, fez barulho e, por hora, melou o plano.
Mas acompanhando o noticiário sobre o tema, descobrimos coisas interessantes.
Cabral tem um personal trainer na cadeia. “Baiano”, a quem paga R$ 30 por dia para manter a silhoueta esbelta.
Muito mais do que isso. Tem um double de mordomo e segurança, o ex-policial Flavio Mello, transferido de Bangu 8 para ser o anjo da guarda de Cabral no xilindró. Mesmo sem ter, pelo que foi mostrado em reportagem de Leslie Leitão, condições para estar no presídio com Cabral, por não ter ensino superior.
Ainda em Bangu as regalias eram grandes. Visitas fora de hora, presos recebendo encomendas no portão e pagando ao entregador, tudo mostrado na TV.
É possível imaginar que a comida mereça atenção especial na La Catedral carioca. Sem o exagero de Pablo Escobar, que chegou a ter três chefes de cozinha no retiro colombiano, mas com o carinho de estar sendo servido por um companheiro de cadeia, já que os fornecedores de quentinha dos presídios também estão guardados. Por negociatas com Cabral.
Difícil imaginar que mandam entregar a eles mesmos a gororoba que possibilitou, entre outras coisas, se tornarem milionários. Apenas um livre pensar aqui, uma suspeita, valendo de estarmos na página de “Opinião” e não de “Reportagem”.
Os relatos contam ainda que Cabral já é o que na gíria da malandragem se chama de “cadeeiro”. O sujeito com manha de xilindró, que passou tempos ali e não tomou sufoco da malandragem, e que chegou a exercer alguma liderança. Seja por força física, econômica ou intelectual. Mais do que isso: aquele que assegura a segurança e o equilíbrio de um xadrez. No caso do ex-governador, parece que é a força da grana mesmo que tem proporcionado alguma regalia e proteção.
Conta-se que é ele que recebe os novos presos, providencia algum conforto, dá pasta de dente e sabão melhor do que aquele sapólio que o estado fornece para o banho. Coisa de cadeeiro, de quem já tá no comando.
Na edição de ontem do Globo, Lauro Jardim conta que o líder da Catedral carioca exerceu seu papel no momento em que o parceiro Nuzman adentrou o recinto para sua breve estadia de 15 dias. Com discurso e salva de palmas.
A mesma empáfia e certeza da impunidade que fez um escroque destruir o maior templo da cidade, matar o Maracanã apenas e simplesmente para seguir seu desvario de tornar-se um bilionário à custa de roubo, segue nas imagens que vamos acompanhando dele agora. O quase um ano de cadeia, a ser completado daqui a 11 dias, não parece ter dado um dedo de lição ao maior ladravaz da história do Rio de Janeiro.
Por hora, vai comandando sua Catedral, como tem mostrado todas as notícias, que se repetem a cada semana.
A “Maldição do Maracanã”, que enquanto o próximo HC do Boca Mole não chega, há de seguir soprando todos os dias nas noites de La Catedral carioca no ouvido do ladravaz o grito do Gerdau e da geral do MaracaA expressão no rosto do cadeeiro é a mesma do governador que ofendia a quem ousava contestar-lhe. Agora em voos mais altos. O cárcere não deu limites a um cleptomaníaco contumaz. Desafia juízes na certeza de impunidade que tinha antes, que o levou até a poder destruir um estádio da história do mundo. Garantido pelo habeas corpus providencial de sempre, do de sempre. A mão amiga que vem de Brasília. Com a qual provavelmente conta que lá na frente, quando esquecerem um pouco dele, irá ter uma forcinha pra aquela domiciliar. Quando o golpe tiver cumprido sua função por completo e destruído qualquer vestígio de estado de direito, direção a qual segue caminhando a passos largos.
Quando todos seguirem distraídos com as pautas de comportamento e os desavisados, manipulados e moralistas de sempre estiverem marchando com a família pela liberdade, controlando a arte, o que se publica, a literatura, o show do Caetano, o que o museu vai expor, o sexo dos outros.
Quando todos zumbis estiverem com suas panelas aplaudindo os facínoras que perderam o pudor até para propor que se normalize o trabalho escravo, quando entregarem a última reserva, quando o impoluto Mendonça Filho decidir o que seu filho vai estudar, quando todos se tocarem que eram bucha no “diálogo entre patrão e empregado” para definir as condições de trabalho, então, a obra estará consumada.
Falta pouco. Mais um aninho, por aí. Nesse dia, não mais será possível se levantar contra o habeas corpus do Boca Mole.
E tudo terá voltado ao velho Brasil Colônia. Sem preto no aeroporto, sem pobre na universidade. Tudo como sempre foi. Pior, com lutas de anos por direitos exterminada. Muito além da Catedral carioca, a Casa Grande intocada e a senzala reposta ao seu lugar.
Se fica algum consolo disso tudo que virá, que alguns que ainda não conseguiram entender, é a vitória que nos restou. Porque acima da lei, dos homens, da física, do que é explicável. A “Maldição do Maracanã”, que enquanto o próximo HC do Boca Mole não chega, há de seguir soprando todos os dias nas noites de La Catedral carioca no ouvido do ladravaz o grito do Gerdau e da geral do Maraca.
Quero ressaltar a idoneidade do Diretor Fabio e do Vice Diretor Cezar. Sou criminalista, vou várias vezes ao Bepe e nunca presenciei algo errado dessa equipe. Essas supostas irregularidades devem ser contadas do diretor da Seap e do Pezao, todos os dois enfiados até a lama nesses escândalos.
Parabéns Lucio,você foi uma das poucas vozes criticas da imprensa sobre o desmanche do Maracanã,se me recordo na época só a espn falava sobre o assunto e o restante da mídia subserviente,corporativista, e o que fizeram com os indignas,humilhados,e a maioria do povo assistindo a tudo na maior passividade,poucos botaram a cara pra bater a favor das minorias e você foi uma dessas pouquíssimas vozes a favor dessa minoria,e estranho ver que a minoria de ontem é hoje a maioria,aquilo ocorrido a 6 anos atrás com os índios expulsos de seu território demarcado era um ensaio do que estamos vivendo nos dias atuais.
Ainda bem que posso ler você, dos raros jornalistas crítico dos desmandos.
Parabéns Lucio. Ainda bem que ainda temos você e sua independência jornalística!