FGV faturou R$ 130 milhões com Ministério do Esporte em 5 anos por “consultorias” para Copa do Mundo e Olimpíadas
Foram R$ 130 milhões em cinco anos.
É o valor total dos contratos de “consultoria e assessoria” da Fundação Getúlio Vargas (FGV) com o Ministério do Esporte (ME) na década dos grandes eventos.
Onipresente em “consultorias, estudos técnicos e assessorias” de todo tipo no Brasil, citada em investigação do Ministério Público Federal-RJ (MPF-RJ) pela não prestação desses serviços por delator e agora até pelo ex-governador Sérgio Cabral, a FGV levou esse modelo de negócios ao ponto mais alto nos anos que antecederam a realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no país. E engordou seus cofres em R$ 130.669.036,00 (cento e trinta milhões, seiscentos e sessenta e nove mil e trinta e seis reais) em quatro convênios com a pasta de esportes, como mostra levantamento da Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo através do Portal da Transparência. Entre dezembro de 2010 e março de 2015. (ver quadro abaixo. Fonte: Portal da Transparência):
Todos esses convênios feitos sem licitação entre dezembro de 2010 e março de 2015. No de maior valor, consultoria fechada por R$ 54.460.000,00 (cinquenta e quatro milhões e quatrocentos e sessenta mil reais), a Controladoria Geral da União (CGU) apontou uma série de irregularidades.
Os quatro contratos, sempre relacionados a Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016, vendem serviços de “consultoria e assessoria” da FGV para o Ministério do Esporte.
Ministro Orlando Silva (PC do B) assinou contrato de R$ 10 milhões com a FGV no último dia de governoO primeiro desses contratos de consultoria relacionado aos grandes eventos foi assinado pelo então ministro do esporte Orlando Silva (PC do B), no apagar das luzes do governo Lula.
No último dia: 31 de dezembro de 2010. No valor de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), com dispensa de licitação para apenas um ano de vigência. Tendo como objeto a “consultoria especializada para monitoramento de projetos para a realização da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo de 2014”.
Aldo Rebelo (PC do B-SP) pagou quase R$ 18 milhões para FGV por consultoria de autódromo que nunca saiu do papelO segundo acordo de consultoria da FGV para o Ministério do Esporte foi assinado em 1º de outubro de 2012 (vigência até 1º de julho de 2013), já pelo ministro Aldo Rebelo, atualmente no Solidariedade, mas também do PC do B (SP) quando ocupou a pasta. Aldo Rebelo assinou acordo de R$ 17.850.000,00 (dezessete milhões, oitocentos e cinquenta mil reais) para “consultoria especializada para apoiar o Ministério do Esporte nas ações necessárias à construção e operação do novo autódromo do Rio de Janeiro em Deodoro”. Se o valor de quase vinte milhões por tal consultoria da FGV para a pasta de Aldo Rebelo foi paga integralmente, o mesmo não pode dizer do citado autódromo de Deodoro, que jamais saiu do papel.
Terceiro contrato de consultoria da FGV subiu para R$ 48,3 milhões e foi assinado também por Aldo RebeloEm 31 de dezembro de 2012, no terceiro contrato da era dos grandes eventos, o mesmo Aldo Rebelo subiria o valor das consultorias pagas para a FGV pelo Ministério do Esporte. Novamente com dispensa de licitação, assinou com a FGV contrato no valor de R$ 21.985.000,00 (vinte um milhões, novecentos e oitenta e cinco mil reais) mas o valor final, de acordo com o Portal da Transparência, foi de R$ 48.359.036,00 (quarenta e oito milhões, trezentos e cinquenta e nove mil e trinta e seis reais) para consultoria de serviços de estimativa de preços de projetos.
A FGV afirma que este contrato teve o valor de R$ 26.374.036,00 (vinte e seis milhões, trezentos e setenta e quatro mil e trinta e seis reais), valor divergente do publicado no Portal da Transparência. A divergência está contemplada ao fim da reportagem em “outro lado”.
Em seu terceiro mês no cargo, o então ministro George Hilton assinou contrato recorde entre Ministério do Esporte e FGVO recorde no valor dos quatro contratos de consultoria e assessoria da FGV para os grandes eventos ficou por conta do quarto convênio FGV/ME, assinado pelo ministro George Hilton (PRB-MG). Três meses depois de assumir o Ministério do Esporte, assinou, em 10 de março de 2015, um acordo de R$ 54.460.000,00 (cinquenta e quatro milhões e quatrocentos e sessenta mil reais), de novo sem licitação, para consultoria de precços para o Ministério do Esporte.
O contrato virou alvo da Controladoria Geral da União (CGU). Que apontou diversas irregularidades. Entre elas: “falhas que permearam os processos de planejamento, de contratação, de execução e de acompanhamento e fiscalização da execução do contrato”, “comprovação insuficiente, por parte da Secretaria Nacional de Esporte de Alto Rendimento, dos requisitos para o enquadramento jurídico do objeto contratual em serviço de natureza singular que justificasse ausência de licitação”, “incoerências no dimensionamento dos valores a serem pagos, em relação ao serviço prestado pela Contratada, que geraram pagamentos incompatíveis com o serviço realizado”, entre outros. (ver trecho relatório CGU):
Foram prestações de serviços sob a fachada de “consultoria e assessoria” que levaram a FGV a ser atualmente investigada pelo MPF-RJ. Em um dos desdobramentos da “Operação Calicute”, a fundação, de acordo com denúncia do MPF-RJ, foi contratada como “laranja” para encobrir transações ilícitas nos mandatos de Sèrgio Cabral no governo do estado do Rio. (Ver citação das irregularidades da FGV na peça do MPF-RJ abaixo):
De acordo com o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, a FGV se prestou a simular tal prestação de serviço apenas para viabilizar e receber propina em esquema de corrupção do ex-governador, que, na última semana, confirmou tal expediente em depoimento na justiça.
Já o ex-governador Sérgio Cabral, em depoimento no dia 5 de abril, afirmou que a FGV atuava como um “biombo para efetuar ilegalidades” durante o governo dele e que “produzia pareceres e estudos com as conclusões que o governo do estado precisava”.
Outro Lado:
Questionada pela reportagem sobre tal valor de R$ 130.669.036,00 por quatro contratos de “consultoria e assessoria” com o Ministério do Esporte sem licitação, a FGV, através da assessoria de imprensa, enviou resposta com outro valor. (Ver íntegra da resposta da FGV abaixo).
Ainda que também acima de cem milhões de reais, a FGV diz que recebeu exatos R$ 108.684.036,00 (cento e oito milhões, seiscentos e oitenta e quatro mil e trinta e seis reais) pelos serviços. Portanto, uma diferença de R$ 21.985.000,00 (vinte e um milhões, novecentos e oitenta e cinco mil reais) para o que aponta o Portal da Transparência, site do governo federal.
A reportagem enviou para a FGV o valor gasto nos quatro contratos disponíveis do Portal da Transparência. A diferença entre o que diz a FGV e o que o Portal da Transparência indica está no terceiro dos quatro contratos, o 52/2012, assinado em 31 de dezembro de 2012 pelo então ministro do esporte, Aldo Rebelo.
A FGV afirma que o valor do contrato era de de R$ 26.374.036,00 (vinte e seis milhões, trezentos e setenta e quatro mil e trinta e seis reais). No Portal da Transparência, tal contrato aparece como “valor inicial” de R$ 21.985.000,00 (vinte e um milhões, novecentos e oitenta e cinco mil reais). Ainda no mesmo portal, a reportagem encontrou a descrição de aditivo de R$ 4.389.036,00 por “alteração de itens no termo de referência e prorrogação do prazo de execução”, perfazendo assim os R$ 26.374.036,00 apontados pela FGV.
No entanto, o valor final do contrato que o Portal da Transparência aponta é de R$ 48.359.036,00 (quarenta e oito milhões, trezentos e cinquenta e nove mil e trinta e seis reais), o que resulta na divergência de de R$ 21.985.000,00 entre o que aparece nos dados públicos e no que a FGV indica ter pago. (ver arte abaixo do Portal da Transparência com o valor final de R$ 48.359.036,00):
Após o questionamento da reportagem sobre a diferença, a FGV voltou a afirmar o valor de R$ 26.374.036,00, mas não explicou porque o Portal da Transparência afirma ser de R$ 48.359.036,00 o valor final pago no contrato. (ver íntegra da resposta da FGV):
FGV:
Ao jornalista Lúcio de Castro
Agência Sportlight
Prezado,
O pedido de esclarecimento, conforme seu enunciado, diz respeito a quatro contratos de consultoria e assessoria celebrados entre a Fundação Getulio Vargas e o Ministério do Esporte, entre os anos de 2010 e 2015, no valor de R$ 108.684.036,00, todos relacionados aos grandes eventos esportivos (Copa das Confederações, Copa Do Mundo, Olímpiadas e Paraolimpíadas) realizados no Rio de Janeiro. O sr. pede que se justifique os valores dos mesmos, respondendo sobre a ausência de licitação e os questionamentos da CGU.
A FGV esclarece o que se segue:
Os contratos firmados com o Ministério do Esporte seguiram padrões e regras de compliance aplicados a todos os trabalhos executados no âmbito da Fundação. São práticas alicerçadas no respeito à ética, com foco na transparência dos atos e, acima de tudo, no rigor técnico de um corpo de profissionais voltados à prestação de serviço de alto valor agregado ao país.
Como é notório, a Fundação é centro de referência nas áreas de pesquisa, estatísticas macroeconômicas, índices de preço, ensino e de desenvolvimento de projetos, reputação construída em 70 anos de atuação. O binômio idoneidade e expertise diferenciada é a base que justifica a contratação por inexigibilidade, tendo sido fornecidos todos os documentos solicitados, atendendo dispositivo da Lei 8666/93. Tal inexigibilidade, inclusive, já foi reconhecida pelos mais diversos órgãos da administração direta, indireta e de controle, em atividade no Brasil.
A prestação de serviços, no caso do Ministério dos Esportes, incluiu:
– Apoio à manutenção e ampliação de base de referência de preços unitários de materiais e equipamentos esportivos, serviços técnicos especializados (médicos, psicólogos, fisioterapeutas, preparadores físicos etc.), medicamentos, serviços de transporte hospedagem, aluguel de estruturas temporárias, entre outros, utilizada pelo Ministério do Esporte;
– Estimativa de preços de projetos envolvendo itens especiais de instalações esportivas e não esportivas para os Jogos de 2016 e acompanhamento de sua execução orçamentária;
– Apoio à precificação de processos de solicitação de convênios pelas entidades esportivas brasileiras à Secretaria Nacional de Esporte de Alto Rendimento – SNEAR.
Com relação à estimativa de preços de projeto, o Ministério categorizou as instalações em três níveis de complexidade (baixa, média e alta), como também estimou a quantidade de instalações a serem precificadas para cada nível de complexidade. Com base nesses níveis e nesses quantitativos, a FGV estimou um valor para a precificação das instalações de acordo com seu nível de complexidade.
Como a Prefeitura do Rio de Janeiro e o Ministério do Esportes decidiram simplificar os projetos das instalações, considerados na fase preliminar do projeto básico, que deram suporte às instalações em 2013, houve necessidade de mudanças nos projetos executivos e, por consequência, nos itens especiais a serem cotados. A título de exemplificação, no projeto do sistema de refrigeração do Centro Olímpico de Handebol foi obtida uma redução de custos no valor de R$ 6,5 milhões, correspondentes a 34% do orçamento balizador para este item na licitação. Somando-se a esse valor as demais economias proporcionadas pela FGV ao erário público nos trabalhos realizados nestes contratos, atingiu-se a cifra de, aproximadamente, R$ 96 milhões.
Os pagamentos dos contratos se deram mediante a entrega e aprovação de relatórios e a comprovação efetiva dos serviços executados. Foram envolvidos na execução profissionais com experiência em projetos complexos (coordenadores) e corpo técnico operacional qualificado, além de uma equipe de pesquisadores de preços espalhados por todo o Brasil. Os valores praticados (remuneração dos profissionais, encargos patronais e bonificações e despesas indiretas) foram compatíveis e até inferiores àqueles de mercado, conforme pesquisa de preços, realizada pela Associação Brasileira de Consultores – ABCO em agosto de 2015 e em parecer específico do Ministério Público junto ao TCU, como será exposto adiante.
Vamos aos contratos:
O contrato 1/2011, refere-se ao “Monitoramento dos Projetos para a Realização da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2015”, no valor de R$ 10.000.000,00. A proposta de trabalho da FGV, enviada em novembro de 2011, responde a um convite do Ministério dos Esportes e atende os Termos de Referência, contido anexo. O fato de o contrato ter sido assinado em 31/12/2010 se tratou de mera coincidência, já que se tratava de um compromisso de Estado e não de Governo, para a realização dos Jogos acima mencionados. Até porque não houve qualquer descontinuidade da política de governo após 2011, tendo, inclusive, sido mantida aa equipe do Ministério dos Esportes na entrada do novo governo. O monitoramento foi realizado em 13 meses, nas 12 cidades sede e todas as atividades da FGV foram consolidadas em relatórios, aprovadas pelo contratante. Até onde se sabe não houve nenhuma contestação a respeito desse serviço.
O contrato 37/2012, refere-se ao “Apoio ao Ministério dos Esportes nas Ações Necessárias à Construção e Operação do Novo Autódromo do Rio de Janeiro, em Deodoro”, no valor de R$ 17.850.000,00. Tal como é indispensável em todos os casos em que a FGV é contratada, a sua proposta de trabalho respondeu a um convite do Ministério dos Esportes e atendeu, precipuamente, os Termos de Referência nela inclusa. Os serviços da FGV se caracterizaram pela modelagem técnica e econômica do novo autódromo, incluindo a definição de suas principais características técnicas, não somente para o automobilismo, como também para o motociclismo e para o kart. Buscava-se criar uma estrutura viável que atendesse as condições das Federações envolvidas, mas dentro de critérios de geografia de mercado, viabilidade econômica e financeira. Em julho de 2013, o Ministério Público Estadual cassou a licença Ambiental de construção, o que fez o contratante suspender o projeto. O Autódromo não foi construído, mas o trabalho contratado junto à FGV foi feito e concluído, estando o projeto da modelagem à disposição para sua construção.
O contrato 52/2012 e o contrato 2/2015, tratam de objetos semelhantes. O primeiro se caracteriza pelo “Apoio à Implantação e Manutenção de Base de Preços Unitários e Composição de Estimativas de Preços de Projetos”, no valor de R$ 26.374.036,00, com duração de 20 meses. O segundo, refere-se ao “Apoio à Manutenção e Ampliação de Base de Preços de Projetos referentes às instalações Permanentes e Temporárias Complementares dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos Rio 2016”, no valor de R$ 54.460.000,00, com duração prevista de 27 meses.
Nesses projetos, tal como explicitado na introdução de nossa presente resposta, tratava-se de um serviço altamente especializado de levantamento de preços, para o que a FGV tem tradição única e incontestável. Todos projetos licitados pelos entes governamentais foram confrontados com as composições dos preços da FGV. Se compatíveis, o processo era continuado, caso contrário, os Governos procuravam atingir os preços sugeridos nas planilhas da FGV. Com essa postura gerou-se incontestáveis reduções dos dispêndios governamentais.
Quanto a eventuais questionamentos da CGU levados a efeito junto ao Ministério dos Esportes, pode-se esclarecer que:
Atestando a lisura da atuação da FGV, em análise da prestação de contas do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, restaram evidenciadas as seguintes situações:
“este Ministério Público não vislumbra irregularidade na contratação em referência (FGV) – quer quanto a sua modalidade, quer quanto ao preço ajustado”, e mais:
“ ..a FGV, ao prover “tabelas de preços de referência nacionais utilizadas pelos órgão públicos nas suas contratações, como por exemplo SICRO do DNIT, a EMOP do Governo do Estado do Rio de Janeiro e o SCO da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e índices de preços notadamente reconhecidos e utilizados oficialmente por órgão do Governo, tais como IPC, INCC IGP, preenche satisfatoriamente o requisito legal de notória especialização”, e mais:
“Em acréscimo aos argumentos acima, recordamos que os índices de inflação elaborados pela FGV a partir de dados de coleta própria de dados constituem a mais antiga e duradoura série histórica de preços do país, remontando a 1948, sendo rivalizados em importância somente pelos indicadores do OBGE, ainda assim posteriores àqueles.”
Ex-ministro do esporte Orlando Silva:
A reportagem enviou pedido de resposta ao deputado Orlando Silva através do seu gabinete, sem resposta.
Ex-ministro do esporte Aldo Rebelo:
A reportagem não obteve contato. Caso venha a receber resposta será aqui publicado.
Ex-ministro do esporte George Hilton:
A reportagem não obteve contato. Caso venha a receber resposta será aqui publicado.
Agora, além do “muito mais que futebol”, na Central 3, posso ler a qualidade de seu jornalismo.